Sobre o sagrado e a organização material da vida: dia 27, as 11h, no CES


No próximo dia 27, às 11h, no auditório 1 do CES, temos uma conversa marcada sobre o sagrado. Vou estar dividindo o papo com a colega Élida Lauris, companheira no Projeto Alice. A conversa acontece no âmbito do Seminário Religião e... Epistemologias do Sul, com a mediação de Teresa Toldy.

Posto abaixo um primeiro esboço do que será a minha comunicação:

Territorialidade, Cosmovisão e Economia Indígena: espiritualidade e outras lógicas de organização material da vida 

Sempre que falamos de sistemas de pensamento, a religião aparece com um dos elementos estruturantes do modo de vida das sociedades. Entretanto, é comum que a atenção se concentre nos modelos religiosos que ganham destaque no Ocidente - seja por constituírem-se neste contexto ou por contrastarem com o imaginário ocidental. Embora o Ocidente esteja atento a algumas diferenças, a construção de representações sociais sobre a Alteridade é carregada de equívocos e ficções, como nos lembra Edward Said. O Orientalismo é um bom exemplo dos rumos que pode tomar esta construção imagética do Outro. 

Seria notadamente oportuno que o Ocidente se abrisse ao diálogo com outras lógicas de construção de sentido. Poderia aprender com estas outras epistemologias, como nos sinaliza Boaventura de Sousa Santos. Diversos conceitos poderiam ser aqui evocados para demonstrar não só a incompletude do pensamento moderno ocidental, como refere Santos, como também a necessidade de uma observação mais atenta acerca de outros modos de ser, existir e prover. 

O que ocorre, muitas vezes, é o contrário. Algumas ontologias tornam-se ainda mais invisíveis, sendo produzidas no imaginário social como residuais e inadequadas aos tempos que correm. É o caso das diferentes cosmovisões indígenas, que apelam, na contramão, para uma outra experiência do sagrado e de tudo o que, de algum modo, é influenciado por ele. 

As cosmovisões indígenas pressupõem uma outra concepção de Natureza, uma outra relação com o espaço e o tempo, uma outra percepção do que devem ser as trocas económicas. O que é caçado, pescado, produzido tem direta conexão com a espiritualidade, podendo-se estabelecer uma relação imediata entre a experiência do sagrado e a morfologia das economias indígenas. Não é por outra razão que refletir sobre os ritos implica refletir, também, sobre os alimentos produzidos, a terra que os produz e o modelo de desenvolvimento que usualmente os inviabiliza. O sagrado, aqui, evoca um modo de vida, uma temporalidade, um saber, uma produtividade que escapa ao Ocidente. Neste sentido, não nos é possível pensar estas cosmovisões indígenas sem um debate sério sobre: (1) as condições de reprodução dos ritos, (2) a provisão dos alimentos que se conectam com o sagrado, (3) a terra como espaço de reprodução ontológica e epistemológica destes saberes e destes modos de vida e (4) o modelo neoextrativista de desenvolvimento, que lhes tem negado a legitimidade da coexistência e a con-temporaneidade.

Nesta conversa, a que chamo de "Territorialidade, Cosmovisão e Economia Indígena: espiritualidade e outras lógicas de organização material da vida", pretendo abordar a cosmovisão Guajajara, trazendo, também, para o debate, algumas reflexões sobre a cosmovisão andina. Neste bate-papo falo da territorialidade como um conceito fundamental para entendermos não só os valores espirituais, mas também a própria organização material da vida em torno da perspectiva do coletivo. Falo ainda do que estes sistemas de pensamento têm a contribuir para maior ampliação da concepção de direito e para a re-significação de conceitos até então nunca postos efetivamente em causa, tais como o de desenvolvimento, crescimento e distribuição de riqueza.

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Para fundamentar esta reflexão, evocarei os contributos de alguns autores, nomeadamente Boaventura de Sousa Santos, Marcel Detienne, Eric Sabourin, Simon Yampara, Dominique Temple, Marshall Sahlins, Charles Wagley, Eduardo Galvão, Mércio Gomes e Claudio Zannoni.




Fonte da foto: http://chebolas.blogspot.pt/2011/11/rito-amazonico-entra-na-lista-do.html

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